por Hernan Angulo | 31/05/2022 | Entrevistas

Entrevista com Catarina Barbosa Careta

Nesta nova postagem da série de entrevistas que fizemos com pessoas que impactaram em nossa história, a IMBR Agro entrevistou a Prof.ª Dr.ª Catarina Barbosa Careta (CBC), professora do Departamento de Economia, Administração e Sociologia

na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP), atuando principalmente com os temas: (i) medição de desempenho logístico; (ii) desenvolvimento e implementação de tecnologias e sistemas de informação na logística de operações de serviços e no agronegócio; e (iii) inovação tecnológica e ambientes de inovação no agronegócio.

A entrevista foi conduzida por Hernan Angulo (HA), um dos founders da IMBR Agro.

HA: Prof.ª Catarina, em primeiro lugar, em nome do time da IMBR Agro, agradecemos a sua disponibilidade para essa entrevista. A primeira pergunta que gostaria de fazer é sobre uma de suas áreas de atuação: a inovação tecnológica para o agronegócio. Você é docente da ESALQ/USP, uma das melhores universidades de ciências agrárias do mundo, e recentemente tem atuado dentro do Centro de Inovação para Agricultura da Universidade, fruto de uma parceria internacional com universidades chinesas. Como que você enxerga o papel da ESALQ no fomento da inovação para o agronegócio brasileiro? Quais são os dois principais desafios que você destacaria dentro dessa papel da ESALQ?

 

CBC: Hernan, agradeço a oportunidade de interação com a IMBR Agro!

Me graduei pela Unesp, fiz minha pós-graduada pela Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo e já conhecia a história de grande relevância da ESALQ, como promotora do desenvolvimento da agricultura brasileira. Acompanhando mais de perto essa história nos últimos oito anos, como docente, não tenho receio em afirmar que a ESALQ não se furta de incluir em sua missão atual o fomento a inovação. Vale destacar que o principal ecossistema de inovação para a agricultura está localizado em Piracicaba e é fruto de iniciativas diretamente promovidas pela ESALQ.

Em minha opinião, a ESALQ está atenta as demandas do mercado e da sociedade na questão inovação e consciente de seu papel, realizando ações externas, vinculadas com os demais atores do ecossistema piracicabano e também internas como, por exemplo, a instituição de uma comissão em janeiro de 2022, que está promovendo um importante diagnóstico das necessidades e iniciativas de inovação e empreendedorismo do corpo docente e discente da Unidade.

 Entre os desafios vivenciados não só pela ESALQ, mas por todas as intuições de ensino e pesquisa que buscam fomentar a inovação, pode se destacar a necessidade de inclusão do conteúdo inovação e empreendedorismo nos cursos de graduação e programas de pós de maneira assertiva, por meio de atividades práticas e complementares e a “desburocratização” do processo de inovação na instituição pública, que desmotiva o corpo docente (em muitos momentos) em converter pesquisa em produtos e serviços tecnológicos.

HA: O Centro de Inovação para Agricultura lançou recentemente a segunda edição do programa “Acelera ESALQ/USP”, visando fomentar ações de inovação e empreendedorismo para o agro dentro do ecossistema universitário brasileiro. Qual é o maior desafio de um programa de aceleração voltado para um setor tão amplo e complexo como o agronegócio? Existe alguma dificuldade comum que você observou nas startups participantes das duas edições do programa?

 

CBC: O Programa Acelera deve ser visto como um primeiro passo para alunos de graduação e pós-graduação converterem ideias surgidas nas salas de aula, nos laboratórios, em projetos de produtos e serviços tecnológicos. O Programa se propõe a ofertar um processo de construção dos projetos permeado pelo contato com especialistas do ecossistema de inovação de Piracicaba.

Certamente o principal desafio é congregar em um programa conteúdo técnico e experiências que abarquem a riqueza de abordagens dos projetos que podem ser “cultivados” no agronegócio. Acompanho o fenômeno “empreendedorismo tecnológico” há alguns anos… em pesquisa temos a oportunidade de observar as características das healthtecs, fintecs… o principal diferencial das agtechs é a amplitude de tipos de tecnologia e ambientes de aplicação, que não estão restritas a hardware e software. Nesse contexto, temas como prototipagem e transferência de tecnologia precisam ser ajustados para o contexto agro.

Uma dificuldade comum e inicial entre as mais de 50 equipes participantes das duas edições do Programa Acelera ESALQ e buscamos atacar é o pouco contato ou a ausência de contato com o conteúdo de gestão de negócios. É importante destacar que grande parte desse público é da área de ciências agrárias e está tendo o primeiro contato com o conteúdo de empreendedorismo e gestão de negócios (finanças e marketing) durante o Programa. Ainda, observa-se que os participantes do Programa vivenciam um desafio comum nas agtechs, que é a dificuldade de conformação de equipes multidisciplinares, em especial de especialistas em desenvolvimento de sistemas de informação. Para mitigar essa dificuldade, o Programa incentiva a formação de equipes de IEs distintas (principalmente das áreas de computação e engenharia) e as inscrições individuais que são convertidas depois em equipes.

HA: Professora, outro tema com que você atua é o desenvolvimento e implementação de tecnologias e sistemas de informação na logística de operações de serviços e no agronegócio. Conectando esse interesse com o trabalho da IMBR Agro, que é justamente um sistema baseado em algoritmos de Big Data, Data Science e Analytics, como você vê o papel dessas tecnologias para a transformação do agronegócio?

 

CBC: Nessa questão tomo a liberdade para focar minha resposta em Tecnologias e Sistemas voltados para Informação e Comunicação, minha área de atuação.

Vivenciamos um momento na evolução do uso de tecnologias denominado de Indústria 4.0. Algumas das tecnologias referenciadas nesse momento, com Inteligência Artificial e Big Data, estão consolidadas em muitas cadeias produtivas. O grande avanço do “4.0” e o que diferencia essa fase das anteriores é a forma de interação de distintos dispositivos tecnológicos (Internet das Coisas) em ambientes de amplo uso de redes (computação em nuvens), tendo como objetivo a otimização de recursos. Nesse cenário, acredito que o agronegócio brasileiro vivenciará nos próximos anos a ampliação de iniciativas que visam a implementação das denominadas smart farms, processos produtivos “inteligentes”, automatizados e integrados a suas cadeias de suprimentos (por blockchains).

Ainda, considerando processos produtivos automatizados e o aumento expressivo de dados gerados, o que pode ser observado como vantagem, também pode ser um desafio para os gestores. O que fazer com tantos dados? Como tratar e analisar esse recurso organizacional de forma rápida? Em minha opinião, o principal mercado a ser ampliado e que poderá impactar positivamente diversas cadeias agroindustriais é o de tratamento e análise de dados com técnicas mais robustas e atuais de Inteligência Artificial e simulação, em especial de soluções que atendam as questões técnicas e de negócios em uma única interface.

HA: E por último, Professora, qual conselho você deixaria para um jovem empreendedor, ou uma nova startup, que está começando a trabalhar dentro do agronegócio brasileiro, pensando principalmente aqueles que ainda estão na universidade ou que sonham em empreender a partir da pesquisa?

 

CBC: Para aqueles que ainda estão na Universidade, o óbvio seria recomendar que “aprendam a programar”, pois essa é a hard skill mais demandada pelo mercado no momento e vital para aqueles que desejam adentrar o empreendedorismo tecnológico. Defendo que é importante não ter receio de conhecer e manipular ferramentas de TI, pois nem todas as técnicas podem ser incluídas em uma grade de disciplinas obrigatórias, contudo acredito que o mais importante é saber que nenhum conhecimento disruptivo é gerado e convertido em tecnologia sem o domínio de conceitos de científicos, de boas práticas apresentadas em sala de aula, então meu conselho é que não ignorem esse momento de suas formações, ele será vital para o sucesso no empreender.

Para aqueles que já empreendem, meu conselho é que se permitam observar oportunidades de pesquisa que apoiem o desenvolvimento de produtos e serviços para causas ainda pouco contempladas pelas agtechs, soluções que congreguem funcionalidades para análise e mitigação impactos econômicos, sociais e ambientais – as práticas de ESG. Ainda, que busquem contato com quem já empreendeu, ouvir experiências e criar uma boa rede de contatos são práticas importantes para o processo de inovação.

Para conhecer um pouco mais do trabalho da Prof.ª Catarina, você pode encontrá-la no LinkedIn ou no Departamento de Economia, Administração e Sociologia da ESALQ!

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